"...brilhe a vossa luz diante dos homens,
de modo que, vendo as vossas boas obras,
glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu."
(Mt 5, 16)

São vários os cristão alentejanos,
ou com profunda relação ao Alentejo,

que se deixaram transformar pela Boa Nova de Jesus Cristo
e com as suas vidas iluminaram a vida da Igreja.
Deles queremos fazer memória.
Alguns a Igreja já reconheceu como Santos,
outros estão os processos em curso,

outros ainda não foram iniciados os processos e talvez nunca venham a ser…
Não querendo antecipar-nos nem sobrepor-nos ao juízo da Santa Mãe Igreja,
queremos fazer memória destas vidas luminosas.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

DO ESPELHO DAS SANTAS MULHERES
Santa Beatriz da Silva (1437-1492)
e Madre Maria Isabel da Santíssima Trindade (1889-1962)

Duas mulheres, duas obras e várias semelhanças. A primeira, Dona Beatriz da Silva, nascida por volta de 1437, fundou a Ordem da Imaculada Conceição. A segunda, Dona Maria Isabel Picão Caldeira Carneiro, nasceu em 1889 e fundou a Congregação das Concepcionistas ao Serviço dos Pobres, dedicando-a à então Beata Beatriz, canonizada algumas décadas depois.
Foi Santa Beatriz que Dona Maria Isabel elegeu para protectora colocando-a no nome da Congregação. Sentir-se-ia identificada com a Santa, com quem tinha certas semelhanças biográficas. Ambas tinham nascido no Alentejo, a pouca distância: Santa Beatriz em Campo Maior e Dona Maria Isabel no Monte do Torrão, em Santa Eulália. Ambas pertenciam a famílias fidalgas radicadas na região. Se Santa Beatriz fora pedida em casamento por duques e condes, recusando-o, Dona Maria Isabel fora pedida por um rico lavrador e aceitara. Neste aspecto, tinham seguido caminhos distintos, mas em duas dimensões da mesma castidade cristã: Santa Beatriz vinculada por um voto privado de virgindade, Dona Maria Isabel vinculada por um voto de fidelidade conjugal. Santa Beatriz foi feliz como virgem consagrada. Dona Maria Isabel também o foi, como esposa. Enviuvando jovem e sem filhos, assumiu o seu passado sem respeitos humanos: afirmou que tivera um casamento feliz e refere-se à morte do marido como o maior desgosto da sua vida. A viuvez e um novo discernimento vocacional conduziram-na à castidade religiosa, como fundadora de uma nova Congregação. Nesta condição também morrera Santa Beatriz, monja professa e fundadora de uma nova Ordem.
Ambas dedicaram a existência à Oração, à Penitencia e à Caridade. Se Santa Beatriz viveu em Castela orando, penitenciando-se e dando esmolas, Dona Maria Isabel teve semelhante perfil, dedicando-se, por Elvas e por outras localidades, ao serviço incansável do próximo. Ambas declinaram os bens temporais, investindo as suas fortunas em obras espirituais. Curiosamente, as duas sairam das suas terras natais e adoptaram como suas as cidades onde quiseram residir. Se Santa Beatriz morou a maior parte da sua vida em Toledo, num mosteiro de monjas dominicanas, acompanhada por duas criadas, Dona Maria Isabel, numa primeira
fase da sua vocação religiosa, quis ser monja num cenóbio dominicano e fez-se acompanhar igualmente por duas serviçais. Criadas de uma e de outra viveram o resto das suas vidas em relação íntima com as religiosas dos institutos que as suas senhoras fundaram. De notar, ainda, que 0 Mosteiro de São Domingos de Elvas foi lugar de referência para ambas: Santa Beatriz tê-lo-a frequentado com os seus pais e irmãos, que ali tiveram a Capela da Conceição para jazigo da família, e Dona Maria Isabel teve ali 0 espaço para a oração e discernimento vocacional. Ainda outra semelhança: ambas tinham requintado gosto artístico, pois Santa Beatriz encomendou importantes obras de arte e Dona Maria Isabel, que frequentou Belas Artes em Lisboa, dedicou-se à pintura.
Mas foi na devoção a Nossa Senhora da Conceição que mais se estabeleceu a coincidência entre ambas. Era devoção típicamente portuguesa, alentejana, ou não estivesse próxima a Igreja de Santa Maria de Vila Viçosa, surgida da primitiva fundação de São Nuno, com cuja neta, a Infanta Dona Isabel, vivera Santa Beatriz. Ambas, na vida e na obra, quiseram ser espelho da Virgem Maria, modelo de todas as mulheres cristãs. Para tal convocaram também outras mulheres, seguindo o caminho da consagração religiosa. Santa Beatriz restaurou e adornou os Palácios de Galiana e a Igreja de Santa Fé para a sua fundação, Dona Maria Isabel fez o mesmo nos antigos edifícios do mosteiro de Nossa Senhora da Conceição de Elvas, com a respectiva igreja. Se Santa Beatriz criou um hábito monástico que reflectia o esplendor de Nossa Senhora, também Dona Maria Isabel e as suas companheiras envergaram semelhante veste. Por fim, a maior semelhança entre ambas foi, sem dúvida, a construção da santidade. Santa Beatriz da Silva e Madre Maria Isabel da Santíssima Trindade, nome de religião, foram mulheres notáveis, cujas vidas e obras ainda hoje resplandecem no seio da Igreja, de Portugal, no mundo inteiro.
José Félix Duque
in «Seara dos Pobres», nº 60 - Outubro/Novembro/Dezembro - ano 2011

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